AA04.04

Primeiro temos de nos amar para depois amarmos os outros


Vamos aplicar um pouco de senso crítico nesta máxima?

Começando pela palavra primeiro. Qual o sentido aqui, o ordinal ou o gráfico?

1- No sentido ordinal.  Como se primeiro lavássemos os pratos, depois os talheres, fossemos para a esquerda, depois para a direita ou comêssemos primeiro as batatas, depois as cenouras. Seria para amar em ordem: primeiro nós, depois os outros. Primeiro a si, depois a esposa, os filhos, o trabalho ou os projetos. Como um rodízio em que se aplica o amor em cada um desses objetos, começando por si mesmo.

2- No sentido gráfico considerando volume ou plano. O volume de amor aplicado em nós mesmos deve ser evidenciado, ficar maior ou à frente (em primeiro plano) que o amor que aplicamos aos outros.

Não creio que os defensores desta máxima estejam utilizando o sentido ordinal, não vou comentá-lo. Mas, se deseja conversar sobre, entre em contato.

Parece-me que estejam aplicando o segundo sentido: o volume de amor que aplicamos em nós mesmos deve ser maior ou considerado prioritário que o dedicado a outras pessoas ou objetos de amor.

R-AA04.06b. Primeiro temos de nos amar para depois amarmos os outros é uma falácia?

Considerando a natureza do amor, qualquer que seja o sentido que você queira usar, já podemos responder à primeira questão: sim, é uma falácia. Porque há dois erros de lógica.

Primeiro erro: amor não tem volume constante para, ao ser aplicado em um objeto, pessoa ou projeto, faltar para ser aplicado em outro.

Segundo: em se tratando do amor a si e aos outros, não há apenas a si e a outra ou outras pessoas para aplicar o amor, há a Terceira Entidade, já conceituada aqui e, por isto, não desenvolveremos este tópico agora.

Amor se distribui

Nosso amor não fica aplicado apenas em um polo por vez, amor se distribui. Não são apenas dois polos como a crença nos faz pensar: nós ou os outros para mar. Como se amando alguém, nosso amor-próprio diminuísse.

Amor podemos distribuir entre nós, com a terceira entidade, com outras pessoas, com projetos de vida e haja sonhos e objetos para amar, facilitar a felicidade ou nos afastar dela.

Há vários locais para priorizar o seu amor, para aplicá-lo. No próprio prazer, em si mesmo, na sua imagem, no seu trabalho, no seu território (suas conquistas), na sua casa, na sua família, na sua formação, na sua sociedade e no seu país, por exemplo. Estratégia seria a palavra de ordem para aplicarmos nosso tempo, valores, atenção e vida, não nós mesmos.

Nebuloso. Fortalecendo os egoístas, os egóicos e os narcisistas. A crença em amar a si em primeiro lugar estimula doenças e doentes sociais e pode esconder egoísmo, nazismo, egocentrismo, machismo, fascismo e abusos de forma geral. Em todos estes casos, o doente social prioriza a si.

Nebuloso. Sabemos que todos temos uma parcela de egoísmo, burrice, orgulho, vaidade e outros atributos negativos, afinal sempre temos onde melhorar. Uns mais, outros menos. Se abraçamos a ideia que devemos nos amar em primeiro lugar, quais as chances de reduzirmos, em nós, nosso egoísmo? Aparentemente esta máxima colabora no seu fortalecimento. Tem certeza de que devemos persistir nesse pensamento em vez de procurarmos o equilíbrio entre nos amar e aos outros?

Nebuloso. Sabemos que há ladrões por aí. Todo ladrão crê que tem o direito de usurpar algo dos outros. Alguns acham que podem até tirar a vida de suas vítimas para realizar seu intento, já que se valorizam mais que aos outros. Mais uma vez: a máxima acima direciona para a desumanidade.

Nebuloso. Ao ensinarmos aos nossos filhos, netos, amigos e alunos que devem priorizar a si, estamos colaborando com a formação de um povo cada vez mais egoísta, quiçá naz-ista. Sim, para ser naz-ista você precisa achar que é normal se valorizar mais que aos outros. Já refletiu sobre as condições filosóficas do naz-ismo?

Se pessoas só valorizam a si, aos seus e a suas próprias coisas, consigo divisar vários outros agraves. Como a ideologia. Se desprezamos a dos outros, o desrespeito prolifera, os atritos e disputas sociais aumentam. O que sabemos ser um dos interesses na atualidade, visando, é claro, o controle social.

Conclusão. Máximas e ditos populares da atualidade que falam de priorizar o amor a sim mesmo, por ignorarem a possibilidade da Terceira Entidade e do equilíbrio, nos deixam a ilusão que temos apenas duas opções: a de valorizarmos a nós mesmos ou aos outros (e nos desvalorizando). O que parece ser um dos mecanismos de adoecimento psicológico e controle social. Nebuloso.

Uma boa quantidade de progenitores, principalmente mães, se sacrificaram para criar os filhos, e simplesmente foram abandonadas por eles. Deveriam ter priorizado apenas a si? Deveriam ter colocado seus filhos para adoção quando tiveram que se sacrificar por eles?

O quadro piora se considerarmos os custos e investimentos. Muitos progenitores costumam dispensar mais do que poderiam à formação e criação de seus filhos. Alguns chegam à terceira idade sem condições de se sustentar decentemente. Muito filhos ajudam, outros, não. Os que amam a si em primeiro lugar, são justos e caridosos com os seus progenitores que porventura precisarem de ajuda?

Há pessoas que fazem de tudo para garantir seu patrimônio. Outros o sacrificam e ainda seu tempo disponível, seus valores, sua vida em prol da família ou da comunidade. Tem certeza de que devemos optar por um dos polos e nunca mudar de lado ou equilibrar as forças?

 

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