Você acredita na Energia?

Regularmente me perguntam se eu acredito na energia. Especialmente quando estou apresentando os mecanismos de ação de alguma terapia alternativa, já que utilizo Fisiologia e não teorias energéticas para isto. A resposta é sempre a mesma: acredito na energia tanto quanto no por do sol. E conto a seguinte história:

Entrei para o ramo das Alternativas há algumas décadas, num tempo em que a grande maioria de seus praticantes não tinha o interesse em torná-las sua fonte de renda. Até porque a mídia da época regularmente apresentava matérias mostrando-a como charlatanismo.

Não entrei para ajudar alguém, mas para resolver um problema meu. Tenho vários problemas na coluna e, quando jovem, sofria de dores nas costas que a Fisioterapia da época não conseguia debelar. Em alguns anos, fiz centenas de seções e as dores persistiam. Quanto aos relaxantes musculares e analgésicos, chegavam a ponto de provocar fortes dores abdominais, diarreia e até tonteira sem, contudo, resolver o problema a contento. Naquela época, regularmente, passava longos períodos dormindo quase sentado porque, deitado, a dor era insuportável ao acordar.

Uma dolorida seção de shiatsu Sohô conseguiu me fazer dormir na posição deitado por alguns dias. Isto bastou para eu passasse a confiar nas técnicas orientais. Fiz o primeiro curso de shiatsu em dois fins de semana. Comecei a praticá-lo com sucesso e fui convidado a participar em projeto social de certa igreja.

Fiz logo um segundo curso de shiatsu para me aprimorar. Método em nada parecido com o primeiro, apesar de ter o mesmo nome: Shiatsu. O terceiro fiz com o falecido mestre Santos, aquele que levou esse método para o SENAC-RJ. Nesta fase fiz vários cursos alternativos. Foram oito de fitoterapia, seis de shiatsu, três de terapia auricular e nem me lembro quantos de massoterapia, algo acima de uma dúzia. Mais cromo, Reiki, bipolaridade, moxabustão, florais, homeopatia, acupuntura (três linhas), quiroprática, treinamento Autógeno, massagem ayurvédica, massagem Tuyná, espondiloterapia, medicina holística, medicina esotérica, medicina ayurvédica (tridochas)... perdi a conta. Mas não me preocupava com o fato de utilizarem teorias e histórias antagônicas entre si.

Iniciei com a parapsicologia em 81, ano em que me graduei em Engenharia Civil, com as terapias orientais em 85, comecei a ministrar cursos em 90, sem nunca abandonar o atendimento social de pessoas na terceira idade. Apenas em 93 fui questionado por um cliente, o que fez minha vida e objetivos se desviarem. Ele me procurou numa crise de ciatalgia (dores nas costas, região do ciático). Com indicação cirúrgica, não conseguia nem se sentar por muito tempo: mantinha-se deitado no chão o tempo quase todo. O shiatsu o trouxe de volta ao trabalho em duas semanas e o reabilitou em cerca de dois meses a ponto de ser dispensado da cirurgia.

E ele me confidenciou mais ou menos assim: - não esperava tão bom resultado; esse shiatsu é bom mesmo, mas sabia que, se você errar os meridianos, ele (o shiatsu) também funciona?

Certamente discordei: eu aprendera que se errasse o trajeto de algum meridiano poderia prejudicar o cliente. Ele comentou suas fontes e eu não me preocupei em registrá-las. Mas resolvi provar que ele estava errado.

Naquela época eu tinha muitos problemas em organizar o trabalho voluntário. O fato de ser engenheiro civil autônomo facilitava disponibilizar algumas horas durante a semana, mas a clientela estava sempre em ampliação, cobrando mais horários. E para complicar ainda tinha os acompanhantes das idosas, como as filhas e netas, que pediam shiatsu ou acupuntura para uma dor de cabeça ou nas costas. Então resolvi utilizar uma delas para provar que não poderia errar o sentido dos meridianos: iniciei a seção de shiatsu fazendo-os nos sentidos errados, já no cuidado em corrigi-lo assim que a cliente fizesse algum comentário negativo. Mas estes comentários não vieram, só agradecimentos e elogios. Completei a seção executando todos os meridianos no sentido inverso e a cliente se foi satisfeita, me deixando surpreso.

Em alguns meses, eu já praticava, atônito, o shiatsu em sentido errado: subia onde era para descer e descia onde era para subir. Então resolvi sair também do alinhamento: em vez de longitudinal, passei a fazer um shiatsu transversal aos meridianos. Ótimos resultados em todos os casos, para meu espanto.

Mais algum tempo e cada vez mais confuso, quase que surtado, troquei o toque shigue-gakun, do shiatsu, por outro que mais tarde viria a saber que estimula a terceira circulação de linfa (a que nutre ossos e cartilagens). E aí a minha eficácia em quadros álgicos como fibromialgias, tendinites e artroses, aumentou assustadoramente. Tanto que tive de optar entre continuar com a Engenharia ou me dedicar às Alternativas.

Não me sentia bem com a situação, sabia que algo estava errado. Sentia-me incomodado em ministrar cursos de acupuntura, DO-IN e shiatsu enquanto desconfia de suas teorias, mesmo sempre confirmando, na prática, ótimos resultados. Concluí que algum mecanismo psíquico ou psicológico estaria por trás das reações de cura: ou eu teria o poder de cura ou o próprio cliente o teria. Assim voltei de novo à UFF - Universidade Federal Fluminense, desta vez no curso de Psicologia.

Lá escolhi cadeiras optativas em Neurofisiologia, onde descobri a Fisiologia e outras ciências fascinantes. Graduei em 99 e desde esta época pesquiso e divulgo os mecanismos envolvidos nas alternativas. Paulatinamente todas as explicações em que eu utilizava teorias energéticas, foram substituídas por explicações em acordo com a Fisiologia ou outra ciência.

Exemplos de experiências que fortalecem as teorias energéticas, mas que podem ser explicadas cientificamente.

Por que ulcerações na mucosa do estômago fazem doer o ponto VC12 (boca do estômago), se não existe nenhum neurônio, fáscia ou qualquer peça interligando estes dois locais? O VC12 fica a meio caminho entre o umbigo e o processo xifoide enquanto que o estômago fica a vários centímetros mais para dentro e ainda alguns mais para a esquerda. O mesmo ocorre entre problemas renais e o ponto VB25, na lateral do corpo na ponta da costela. A energia passa lá antes de chegar e nutrir a víscera?

Por que o consumo de leite e seus derivados aumentam a produção de muco? O leite esforça o baço, que libera sua energia - a fleuma; a fleuma sobe aos pulmões, fazendo-o trabalhar muito; assim o pulmão libera sua secreção, o catarro?

Por que massagear um ponto, como o carpo, reduz a dor e ajuda na reabilitação de um problema no mesmo ponto, mas no outro braço? Porque os meridianos são bilaterais?

Como que retirar um pouco de sangue, tipo 40 ml, ou provocar um hematoma (auto-hemoterapia ou aplicação de ventosa até o hematoma aparecer) aumenta a imunidade e reduz sintomas ou alivia patologias como TPM, viroses, diarreia, cólicas, dores em geral, cefaleias e gastrite? Porque o excesso de energia sai junto com o sangue?

Como a compressão do tecido - massagear um ponto qualquer - consegue reações antálgicas, ações nas vísceras, nas glândulas e seus hormônios e até na compensação muscular? Porque promove entrada ou saída de energia?

Por que a propriocepção - uma pedra ou apenas um esparadrapo colocado em certos pontos sobre a pele - tem ação nas vísceras, no relaxamento muscular, nas glândulas e seus hormônios e até no quadro emocional? Porque promove entrada ou saída de energia?

Ora, estes e todos os outros casos de eficácia das terapias antigas podem ser explicados por alguma ciência, em especial a Fisiologia. E não ficam dúvidas nem contradições como nas explicações energéticas.

Faça um teste. Responda uma dessas perguntas ou lance outra questão energética e a envie para o autor.

Por que prefire a Fisiologia?

Por causa da eficácia. Pensemos clientes com viroses, na TPM, menstruadas e diabéticos. Ora, se somos profissionais de apenas acupuntura, Reiki, moxabustão ou shiatsu, trataremos estes clientes apenas com o método que conhecemos. Mas se dominamos várias técnicas, algumas se mostrarão mais eficazes que outras conforme o caso. As teorias energéticas não têm o hábito de definir categoricamente seu campo de ação. Tratam toda e qualquer patologia com o mesmo método: aquele que o terapeuta domina, seja acupuntura, Reiki ou Shiatsu. Em acordo com a Fisiologia, a escolha do método aumenta e muito a eficácia da seção.

O mesmo se aplica a massoterapeutas: a massagem pode priorizar o aquecimento da pele, a drenagem de linfa superficial ou profunda, a drenagem extraprofunda, o alongamento, a propriocepção, a soltura de fibras musculares, a lubrificação das cápsulas articulares ou a nocicepção. Ora, cada um destes direcionamentos alcança resultados que são indicados em certas patologias e contraindicados em outras. Uma avaliação científica pode ajudar o terapeuta a selecionar o melhor direcionamento, aumentando sua eficácia. 

Você, afinal, acredita na energia?

Sim, como acredito no pôr do sol. Sou um ser humano. Mesmo sabendo que é a Terra que evolui em torno do sol, continuo tendo a sensação de que é o sol que se levanta, cruza o céu e se põe.

Nosso sistema nervoso é limitado e isto nos faz ter sensações e emoções que não são assim tão verdadeiras. Como o pôr do sol: vemos, sentimos, nos emocionamos como se o sol contornasse a Terra. Mas sabemos que não é bem assim que funciona. É também assim com a sensação energética: sentimos, nos emocionamos, nem vemos, mas sabemos da sua existência como temos certeza do pôr do sol. Todos sentimos sensações que atribuímos à energia!

Apesar de conhecer as explicações científicas, continuo tendo sensações, agradáveis ou não, quando vejo pessoas ou visito lugares. Continuo sentindo a qualidade energética de pessoas e ambientes, algo que sei ser decorrente da limitação de meus sentidos.

Então, já que acredita na energia, por que prioriza a Fisiologia?

Não é bem assim. No dia a dia, curto a energia. Seria um tolo se não o fizesse. A vida é para ser sentida, certo? Na clínica, buscando eficácia, abandono a sensação energética e priorizo Fisiologia, Etiologia e outras ciências.

Por que esta escolha não é a da maioria dos terapeutas?

Há quem argumente: parece tão simples e óbvio, por que praticamente todos os outros terapeutas preferem as sensações e as teorias energéticas?

Posso enumerar vários motivos.

1) Falta de conhecimento. Sentimos a energia, nos contam a partir dela, a eficácia das terapias é facilmente observada o que confirma as teorias, utilizam o argumento de que é uma prática milenar, os nossos sentidos comprovam boa parte das teorias e ainda temos a crença que nossa intuição vale mais que as ciências. Por que questionar? Cada vez mais vemos políticas de controle social defendendo a auto-valorização e o afastamento da razão e das ciências.

2) Falta de interesse das instituições que ministram os cursos. Se num curso de acupuntura fosse priorizada a Fisiologia, divulgaríamos os cinco mecanismos de ação eliciados pela inserção da agulha numa aula de duas horas. Mais duas horas para a prática das quatro formas de se inserir uma agulha. O curso não passaria de uma semana. Poderia facilmente ser todo ministrado, experimentado e treinado em um período de dois meses. E ainda sobraria tempo. Com prejuízo da renda de dois anos do curso de pós-graduação. Que instituição se interessaria em priorizar as ciências neste caso? Melhor optar pelas complicadíssimas teorias orientais e acusar os ocidentais de incapazes de sentir e compreender plenamente as energias. Pior: acusar as ciências de serem preconceituosas, primitivas, de não estudarem o que não podem ver. Tem coisa pior? Quase nenhum campo das ciências é visível! Você não vê a força da gravidade, a corrente elétrica, como funciona o computador e quase todas as leis científicas. Mas como as explicações científicas não dizem o que eles querem ouvir a respeito da energia...

3) Controle social. Se os indivíduos de uma sociedade utilizassem um padrão lógico-científico para tomar suas decisões, teriam controle sobre os políticos. Se cada um segue suas sensações e intuições, acaba por ter muitas religiões, grupos, interesses e filosofias incompatíveis entre si, o que desune o povo. Se cada um defende apenas seus interesses, se valoriza a ponto de acreditar que apenas se realizando há prosperidade social, jamais haverá união no povo. Assim a grande mídia, a ONU e os organismos do governo, incluindo aqui até a Educação e a Justiça, conscientemente ou não, têm uma tendência de valorizar as opiniões, as sensações e os interesses individuais em detrimento dos sociais: dividir para enfraquecer, seja consciente ou não.

Mesmo que a grande maioria não saiba, ao priorizar o indivíduo e seus interesses individuais estão ajudando a manter mecanismos de controle social e o consumismo. Quanto mais valor uma pessoa se dá, mais coisas de valor ela procurará adquirir e menos tempo e interesse terá, por exemplo, com a família ou a sociedade. Tipo assim: procurarão orientar a família e a sociedade de como devem ser para que a relação com ele mesmo seja ótima e equilibrada, mas dificilmente terão tempo para servir e cuidar tanto da família quanto da sociedade em assuntos em que o mesmo não tem interesse direto: como se dedicar a uma relação que lhe traz sacrifícios?

Lembrando Matheus Rocha: é desnecessário ficar comprovando algo a alguém. As pessoas tomam como verdade aquilo que lhes convém. Taí outra sensação com valor de verdade: o que nos convém deve ser o verdadeiro.

Não que priorizar as ciências e a razão garantisse sempre as melhores tomadas de decisão, mas certamente diminuiria drasticamente as decisões que prejudicam a sociedade e o próprio indivíduo. E traria muitas vantagens, como a melhor seleção dos políticos e políticas de Educação e consumo. Nada do interesse do governo ou do consumismo.

Então como você lida com as sensações, inclusive do por do sol e de que a energia existe?

Fácil. No dia-a-dia e nos assuntos pessoais, curto o pôr do sol e as sensações agradáveis. Seria um tolo se desprezasse minhas emoções e sensações. Na prática terapêutica e nos assuntos sociais, sigo saberes éticos e científicos. Seria narcísico se assim não o fizesse.

Foi-se o tempo em que eu, tolamente, dizia que as ciências só estudam o que é material. Isto é falso, as ciências estudam tudo. Mas como o estudo científico não interessa a muitos, preferem não conhecê-lo, não divulgá-lo, acusá-lo de preconceituoso e simplesmente desprezá-lo.

Junto acabou-se o hábito de me sentir superior às ciências porque tenho uma sensibilidade que pensava não ser estudada por ela. Hoje, objetivando mais eficácia no meu trabalho, utilizo explicações em acordo com as ciências. Visando uma sociedade mais equilibrada, sigo padrões éticos e não os meus interesses nas tomadas de decisões.

Assim acredito cometer menos erros do que cometeria se só seguisse prioritariamente a minha intuição ou apenas as orientações científicas.

 

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