Sobre o caráter defensivo da depressão


Acho que há algo relevante a considerar sobre a depressão antes de pensarmos o seu tratamento. A depressão, pelo menos inicialmente, pode ter certa utilidade a nossa saúde por causa de seu caráter defensivo.

Sei das alterações hormonais, das doenças associadas a este mal, que este estado está na raiz de muitos outros males e que há até casos de suicídio. Sim, a depressão demanda atenção e sempre deve ser tratada como um caso grave. Mas devemos compreender seu processo antes de propormos alguma terapêutica.

Já perceberam que geralmente a depressão se dá em resposta a alguma situação de dor ou sofrimento?

Imagine alguém que investiu muito de sua vida na criação dos filhos, para que eles não tivessem tantos sofrimentos quanto seus pais. Se experimentar vê-los com dificuldades que nem eles nem seus pais conseguem resolver, podemos imaginar o sofrimento para esse pai ou mãe? Tente imaginar. Do mesmo modo, como se sente alguém que trabalhou por anos para conseguir algo, como uma casa própria, o reconhecimento de alguém, certa companhia até o fim de seus dias, e fracassou. Dá para imaginar o que é a derrocada de um sonho que durou anos? Calcule, ainda, o sofrimento de ter sido traído pelo seu melhor amigo, seu sócio ou pelo seu cônjuge, e nada poder fazer. Sabe como se sente um trabalhador que perdeu o emprego, tem o desejo que seus filhos não passem fome, mas acaba por vê-los mendigar ou ir almoçar na casa dos parentes que o acusam de incompetente? Avalie um quadro de dor e que se sabe terminal, como o paciente reage? Reparou alguém que fez de tudo para ser uma boa pessoa, foi mal interpretado e hoje sofre calúnias e injúrias? Sabe daquele jovem que se apaixonou perdidamente, mas não foi correspondido, apesar de ele ter investido tudo que tinha? Sabe a sensação de impotência que nos acomete depois de sofremos assaltos ou ações que nos fazem sofrer sem podermos revidar ou pelo menos nos proteger?

Perceba: certas situações são responsáveis por um grande sofrimento. Fracasso, traição, luto, dor, Burnout, abandono, falta de respeito e valor, ameaças e tantas mais situações que promovem alguma descarga hormonal substancial, patológica mesmo, por longo período. No intuito de se defender, o organismo altera a produção de vários hormônios como a noradrenalina, o cortisol, a dopamina e as endorfinas. É nesta hora que vem a depressão defensiva: reduzimos nossa sensibilidade. Menos sensíveis ao sofrimento, menos produção hormonal negativa (noradrenalina e associados), menos males ao nosso organismo, menos sofrimento físico e psicológico e redução na sensação de dor, daí o quadro ser útil à manutenção da saúde.

Caso a nossa sensibilidade não se reduzisse, as alterações hormonais e orgânicas provocadas por estas fases de sofrimento seriam ainda mais lesivas. Então nosso corpo reduz a sensibilidade – se deprime. Já pensou uma fase em que um pai precise levar os filhos para almoçar na casa da sogra que o acusa de incompetente? De alguém que investiu em determinado objetivo de vida, fracassou irremediavelmente e, já sem tempo de rever e investir em outro, teve de assumir a derrocada? Conhece alguém que se valoriza muito, mas não consegue receber o mínimo de valor nos lugares que frequenta? Alguém que está sentindo o peso da idade e ainda não realizou seus objetivos e sonhos? Sabe o que é continuar vivo apesar de o motivo principal de sua vida, o seu filho único, ter morrido?

Reflexão 07. O que acha da abordagem: a depressão costuma ter caráter defensivo e esta poderia ser a principal função do quadro - nos poupar das reações orgânicas negativas quando em sofrimento prolongado?

 

Depressão 08.